Eu ouvi
tantas historias, eu revivi a parte mais importante da minha própria, eu dei a
luz novamente à minha filha.
Conheci personagens fascinantes, mães sofridas, morando em casa alheia há dias, meses, com suas crias em estado de alerta, preparadas para um novo parto ou a partida, um gosto de incerto constante no ar.
Conheci personagens fascinantes, mães sofridas, morando em casa alheia há dias, meses, com suas crias em estado de alerta, preparadas para um novo parto ou a partida, um gosto de incerto constante no ar.
Ouvi um
incesto entre tio e sobrinha, como ela ria, como contava de alma alegre a
paixão pecadora, proibida.
A louca que
ali vive. Uma vida toda, que dorme todas as noites sobre os bancos de concreto
frio. Com seus cobertores, dados. Fala com muitas pessoas que somente ela vê, às vezes sorri, às vezes grita e passa assim seus dias, brigando com o
invisível. Vestindo-se de homem para não agredirem sua feminilidade.
Os homens
de preto, que tem por profissão e obrigação não ver o lado humano, a dor de
quem sofre, apenas seguem o caminho da burocracia, o que importa são os crachás
dependurados ao peito, não importando se por trás dele bate um coração ou há um
vazio.
Nos bancos
frios derramei muitas lágrimas, olhando o trabalho das incansáveis formigas,
que todos os dias religiosamente subiam e desciam, com pétalas de todas as
cores, fazendo uma trilha colorida de trabalho à caminho de casa. Sem se
importar com a fumaça saindo de bocas angustiadas pela apreensão.
Enquanto
dentro de mim, minha filha sentia dor. Dor que eu sentia, no rosto que ganhou novas
linhas, nos fios brancos que apareceram. Apreensão e dor.
Dentro de
mim o parto se fazia, tempo incerto do nascimento.
A alegre
mulher que parece ter sido colocada de propósito a espalhar sorrisos e arrancar
sorrisos de rostos tristes e cansados. Fotografei-a quero a lembrança desse
sorriso sempre, em momentos de tristeza.
O paciente
que no momento da alta fez a enfermeira cumprir a promessa feita dias antes e a
convidou para dançar. Num quarto com mais pessoas acamadas, os dois ao som de
uma musica bem baixinha, provavelmente vinda de um celular, dançaram um
samba rock, momento de alegria, no quarto. Fui testemunha e pude sorrir com a
alegria alheia.
De um anjo
que estava no mesmo quarto que minha filha. E, num dos momentos de maior angústia, ela me fez respirar, acalmar. Respira, apenas respira e entrega.
Obrigada Vera de verdade.
Enquanto
minha filha se refazia com a ajuda dos homens e todas as preces a Deus, meus
sentimentos vieram à tona, lembranças de dores, momentos vividos no passado em
mim se fizeram presente, hora de resgatar a mim mesma acima de tudo. Nesse
momento o destino se repete, para que, dessa vez o perceba, sinta e cresça. Sim
entendi.
As árvores
continuam a chorar, sei que muitas mães nesse momento estão lá, na expectativa
que me atravessou por dias. Destinos a cumprir. Rezo por elas.
Hora de dar
a luz novamente. E minha vida se refez minha filha outra vez. Dentro de minhas
entranhas já em idade adolescente veio à luz, minha filha está bem... Dias de
aprendizado.